FESTA DE SÃO JOÃO
recordações de guignard
ALMEIDA, Lúcia Machado de. Recordações de Guignard. In: Jornal de Minas. Sem local. Sem data.
GUIGNARD E O NATAL
Mestre Guignard adorava o Natal. Era comovente vê-lo enfeitando a sala com ramos de pinheiro, laços de fita vermelha, sininhos... Isso lhe vinha da infância em Petrópolis, pois seu pai gostava de comemorar aquela data em grande estilo, e chegava ao ponto de mandar o menino Guignard e sua irmã Leonor para casa de amigos nas vésperas da Grande Noite, a fim de melhor preparar as surpresas.
GUIGNARD E SÃO JOÃO
O aniversário do pai de Guignard (véspera de São João) era muito festejado. Havia sempre um almoço de duzentas pessoas ao ar livre, na “Cremerie" (Petrópolis) e, à noite, uma feérica exibição pirotécnica que empolgava o menino-artista, marcando para sempre sua sensibilidade. Mais tarde Guignard iria pintar bosques que pareciam explodir como fogos de artificio e paisagens enfeitadas de balõezinhos coloridos.
GUIGNARD E O NAUFRÁGIO
Ainda menino, Guignard viajou para a Europa com sua mãe, a irmã e o padrasto (que, aliás, ele detestava) num vapor inglês chamado “Madalena”. Eis que em Leixões (Portugal) subitamente o navio se choca num recife, devido à cerração, e ameaça afundar. Meio dia, exatamente. Um rombo enorme na sala das máquinas torna iminente o naufrágio. Guignard jamais iria esquecer os gritos, o pânico da gente de bordo, o apito rouco do barco moribundo, respondido pelo eco, a orquestra tocando valsas forçadas, o comandante oferecendo, nervoso, sorvete às crianças... Todos salvos, afinal.
GUIGNARD E AS CRIANÇAS
Uma das maiores alegrias da Guignard, em seus últimos meses de vida, era encher sua "Rural Willys” de crianças e passear com elas pelos arredores de Ouro Preto. Outra coisa que gostava de fazer: ficar na sacada da casa onde vivia, atirando uma infinidade de balas para os meninos da rua, que gritavam, entusiasmados: “Viva o baleiro! Viva o baleiro!”
GUIGNARD E OS MÚSICOS
Instalado em sua varanda, o Pintor ouvia certa tarde uma banda de músiva que tocava na vizinha ponte Marília de Dirceu. Era quase noite, e o Mestre trazia à cabeça um grande chapéu.
— Tudo isso é frio. Guignard? perguntou-lhe alguém.
— Não, o chapéu é para cumprimentar os músicos quando eles passarem aqui em frente.
GUIGNARD MÍSTICO
Apesar de não ser católico apostólico romano, o Mestre, sem o saber, era profundamente cristão. Comovia-se com tudo o que era pobre, fraco, desprotegido, e tinha como "motivos” prediletos de seus quadros, os Cristos, São Sebastião, São Francisco. Contou-nos que, desde mocinho, antes de iniciar alguma obra importante, costumava entrar numa igreja vazia, ali permanecendo por alguns minutos.
GUIGNARD E SUA CASA
Sonhando com a casa que comprara em Ouro Preto, o Mestre chegou a determinar o modo pelo qual desejava que fosse restaurada.
— Quero fazer Ouro Preto entrar pelas janelas, e continuar a paisagem nas paredes — disse ele, referindo-se às pinturas que pretendia executar nela.